terça-feira, 8 de setembro de 2009

Cinema de verdade


Foi uma noite incrível. Mais de trezentas pessoas lotaram as salas 3 e 4 do Arteplex da Praia de Botafogo na última quinta-feira para assistir ao documentário ‘HU’ (a foto acima é do debate!). A projeção digital estava belíssima (obrigado, RAIN!) e o debate após a sessão foi ‘quente’ como esperávamos. A mesa composta pelos diretores do filme e por Roberto Segre (crítico de arquitetura), Consuelo Lins (professora da Escola de Comunicação) e pela artista visual Rosângela Rennó não desperdiçou a oportunidade de discutir, por pouco mais de uma hora, o filme, o HU, o país. Ela contou ainda com a contribuição de inúmeras participações do público, já que muitos permaneceram na sala para a ‘conversa’ após a projeção. Destaque para as intervenções do Dr. Alexandre Cardoso, atual diretor do HUCFF, do engenheiro Jairo Villas-Boas, ex-diretor da divisão de engenharia do hospital e da professora e arquiteta Margareth Pereira. Todos estes ‘participantes’ do filme que não se fizeram de rogados, pediram a palavra e continuaram e desenvolveram, ali mesmo na sala de cinema, a discussão iniciada no documentário: o filme não se esgotou na tela e, naquela noite, reverberou em muitos dos presentes à sessão. Muito obrigado a todos.


Nas fotos abaixo, as intervenções do Dr. Alexandre Cardoso e da prof. Margareth Pereira.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

O Enigma III

Ainda o antropólogo Eduardo Viveiros de Castro: “Em qualquer lugar, se você cair nas garras do Estado, você só sai delas com muita sorte. Não carece ser brasileiro. Se você vai aos Estados Unidos, veja lá sua relação com o imposto de renda; nem precisamos falar do regime de terror implantado pelo governo Bush filho. Vá a Inglaterra e veja o que acontece se você, sei lá, cruzar a faixa no lugar errado. Caia na besteira de oferecer uma graninha para o policial quando não devia ter feito isso (e, pelo menos no Brasil, vice-versa). Você nunca mais escapa. Vai ficar preso numa rede. O Estado é implacável. A essência da burocracia não é a racionalidade, mas a impessoalidade. A única pessoa ali é o Estado, não tem mais ninguém. O Estado é o grande sujeito. E vice-versa: l’État c’est le Moi.”

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Por que somos assim? (Diário de Montagem VI)


Há algo que me agrada nas diversas entrevistas do filme. Ninguém ali parece evitar a complexidade das questões abordadas. Ninguém parece à procura de um culpado – seja ele uma pessoa, uma idéia, um projeto. Parecem suspeitar tacitamente que o buraco é mais embaixo e o ‘problema’ frequenta a todos. Ecoam até hoje as perguntas do diretor do hospital, Dr. Alexandre Cardoso: “Porque é que somos assim? Nós não podíamos dar continuidade no ano seguinte para que o hospital pudesse ficar pronto? Como é que nós havemos de enfrentar outros desafios sociais?”

terça-feira, 1 de setembro de 2009

O enigma II


“Um dos traumas típicos, no mundo indígena, envolve uma saída solitária de uma pessoa ao mato, para caçar, por exemplo, a qual desemboca no encontro repentino com esses germes, essas larvas de Estado que são as alteridades-espírito, as agências sobrenaturais com o poder de nos contra-definir: ‘Aqui o sujeito sou eu. Você não é humano coisa nenhuma. Venha pra mim, torne-se um de nós.’ Você topa com uma onça, ela te olha diferente, você não consegue fugir do contato ocular: aí o bicho se transforma (a teus olhos) subitamente em uma pessoa, um parente por exemplo, e lhe pergunta – ‘por que você quer me matar, meu irmão?’ Não responda! – ou você já perdeu. A onça não é teu parente. A onça é a ausência mesma de parentesco.”

“Isso é um pouco como a idéia de Estado, que é suposto se constituir historicamente contra as antigas solidariedades de parentesco. Diante do Estado não somos mais que indivíduos. Todo mundo deve estar eqüidistante do Estado. As pessoas estão articuladas a ele sem mediação dos laços familiares. É você de um lado, sozinho; do outro lado, o Todo. No meio, nada – o vazio relacional. A criação súbita de você como indivíduo particular, como parte, e o Estado como o público, como a totalidade. A parte da parte e a parte do todo: a parte do leão, justamente; o leão do Fisco, a super-onça do Estado. E nós, os cidadãos-caititus, particularmente perdidos na mata da economia capitalista.” (fonte: Eduardo Viveiros de Castro/ Série Encontros: Ed. Azougue)